segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Believe in Bolívia!

Para sair do Chile, embarcamos num autocarro pelo meio do deserto de Atacama. Quando anunciaram a fronteira com a Bolívia, mandaram toda a gente sair para tratar do visto.

A paisagem era desoladora. Areia, pedras, um vulcão com o topo coberto de neve no horizonte e lamas de pescoço esticado a olhar curiosos para a agitação. Aparte destes animais, parecia que estávamos numa paisagem de Marte.

Dentro de uma casinha, um senhor de fato treino carimbava os passaportes. Por cima dele uma fotografia de Evo Morales, o presidente indígena do pais. Um revolucionário anti-Estados Unidos que expulsou o gigante Macdonalds da Bolívia!

Tinha alguma curiosidade sobre este senhor. Aliás, até sentia alguma admiração pela sua coragem! Uma vez li um facto curioso: não há nenhum pais no mundo que esteja em guerra e tenha Macdonalds. Coincidência?

Por este facto e pelo espírito revolucionário anti-capitalista que já tinha presenciado nestes 70 dias de viagem, estava à espera de encontrar uma sociedade em ebulição, com uma ideologia forte, segura do seu caminho e apostando nos seus recursos, turismo e cultura.

Mas após 10 dias na Bolívia fiquei um pouco desiludido. Afinal o presidente Evo não tem um rumo muito estável. Parte da atitude anti-EUA deve-se ao facto de os Americanos terem dado asilo político ao antigo presidente que fugiu há uns anos com umas malas cheias de dólares. O senhor Evo tentou ripostar recentemente dando asilo político a Edward Snowden, mas não conseguiu e até arranjou problemas com Portugal e outros países Europeus que não deixaram que o avião aterrasse nos seus territórios! Lembram-se disto?

O turismo não tem uma estratégia, apesar do país ter alguns dos sítios mais belos do planeta. As pessoas e os lugares não estão preparados para receber. Pela primeira vez estivemos em sítios sem electricidade ou papel higiénico. Internet nem vê-la apesar dos vários letreiros wifi. Pergunto-me se não será uma armadilha para estrangeiros. Rio-me ao pensar nisso.

Foi excelente estar nestes sítios genuínos e sem grandes organizações, pois apesar dos muitos desconfortos e de estarmos perdidos algumas vezes, não é isto que é viajar também?

Voltando ao líder da nação, Evo Morales, algumas das suas medidas e frases mais famosas incluem:

- O pagamento de um imposto especial para mulheres com mais de 18 anos que NÃO tenham filhos, com o intuito de aumentar a população.

- Sobre uma conhecida marca Americana de refrigerantes referiu, "a coca cola põe as pessoas carecas!"

- E no que toca a futebol, mostrou todo o seu conhecimento quando afirmou, "a minha equipa preferida em Espanha é o Barcelona, mas na Europa é o Real Madrid..."

Uma das leis que mais me surpreendeu é que os edifícios inacabados não pagam imposto. Posto isto, as pessoas não pintam os prédios onde habitam, deixando os tijolos cor de laranja à mostra, reforçando assim que o prédio não está acabado!!

Quanto ao povo em si, este não é como o Chileno ou Argentino. Estes dois últimos tinham pessoas bastante acolhedoras e era possível sentirmo-nos integrados mesmo sendo estrangeiros. Na Bolívia, há os Bolivianos e há os estrangeiros, não há cá misturas. Em muitas situações foram antipáticos, mas pronto há que aceitar a cultura. Também houve excepções e encontramos alguns nativos simpáticos. Têm conflitos de longa data com o Chile e saíram a perder em muitas guerras... Têm pouca auto-confiança e orgulho.

La Paz é a cidade mais alta do mundo a cerca de 3500 metros de altitude. Toda a cidade está enfiada num vale montanhoso. A paisagem deixa qualquer um de queixo caído. Colinas gigantes cheias de casas de tijolo, ruas a pique e milhares de fios eléctricos. Vivem lá 2 milhões de pessoas.

Uma das visões mais clássicas de La Paz são as senhoras de chapéu de côco e várias camadas de saias coloridas. Não é raro ver estas senhoras, com as suas bonitas tranças pretas, a carregar um bebé, as compras para casa ou o que vão vender nas ruas, tudo ao mesmo tempo!! Enquanto isso, e ao seu lado, o marido caminha tranquilo sem nada para carregar...

A Bolívia foi dura em termos físicos. As altitudes não deixam respirar tão bem e o corpo ressente-se. Várias vezes a subir escadas ou ruas ficamos sem ar. Também tivemos chuva, muito frio, calor abrasador, escaldões na pele...foi duro.

A natureza voltou a surpreender! O salar do Uyuni, o maior deserto de sal do mundo é majestoso. Como pode haver tanto sal a quase 4000 metros de altitude? No deserto de Atacama, este feito de areia, vimos novamente montanhas coloridas e rochas com formas caricatas devido à erosão de milhares de anos!

No meio de alguns kilómetros de areia que fazíamos de jipe, iam aparecendo também géiseres, lagoas às cores com flamingos e lamas a passear nas suas margens. Às tantas, quando aparecia uma lagoa já dizíamos "xxiiiii mais uma, que seca, estou farto de lagoas!".

Nos arredores de La Paz, descemos a mítica estrada da morte de bicicleta e a paisagem alterou -se completamente. Esta estrada desce 64 kms em estradas estreitas de gravilha e rodeada de penhascos. Nas montanhas onde fica situada a estrada, parece que estamos numa selva cerrada, tal é a quantidade de vegetação. As histórias sobre o perigo da estrada não são mentira, mas qualquer pessoa com um mínimo de consciência faz a estrada sem problemas de segurança.

Uma curiosidade: nos últimos anos morreram 19 pessoas a descer esta estrada de bicicleta, 12 eram israelitas... Os viajantes com atitude fatalista, um dia escreverei mais sobre eles.

No dia em que descemos a estrada, chovia torrencialmente e havia muita lama, o que trouxe dificuldades acrescidas. Neste vale onde se encontra a estrada, produz-se a planta da coca. É o segundo local do mundo onde se produz mais quantidade, apenas atrás do Sul da Colômbia. O próprio Evo Morales tem a sua plantação!

Depois do deserto, do salar e da selva a norte de La Paz, pensávamos que a Bolívia não nos ia surpreender mais...

Mas quando chegamos à Ilha do Sol no Lago Titikaka, esse pensamento provou ser errado. Uma ilha parecida com Santorini. Um lugar com um pôr-do-sol de quadro impressionista e onde vimos paisagens únicas.

Um dos sítios mais bonitos que visitamos nesta viagem: a Ilha do Sol (sim é verdade, cantámos a música do Netinho algumas vezes). A Ilha que os Incas diziam ser o local onde nascia o sol.

Nesta ilha também tivemos a oportunidade de ver aldeias bolivianas que permaneceram intactas com o passar do tempo. Burros, porcos, vacas e lamas. Campos de favas e milho descendo em formas de terraços pelas colinas. Casas de pedra com telhados de colmo. Famílias inteiras a lavar a roupa no rio. Caminhos de pedras soltas.

Senti-me mal de passar neste sítios com a minha roupa de turista.

Agora estamos no norte da Bolívia numa vila chamada Copacabana. Queremos apanhar um autocarro para Cuzco no Perú, ex-capital do império Inca e base de partida para Machu Pichu.

Só que... Há uma greve a bloquear a estrada por isso não sabemos se conseguimos sair hoje ou nos próximos dias!

A ver vamos! Até lá... Think about it!

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Chile com carne!

Mal-me-quer, Bem-me-quer, assim foi o Chile.

No escudo governamental Chileno vem escrito "Con la razon o con la forza." (Com razão ou pela força!). Esta frase é uma boa introdução sobre o espírito do pais. Ou vai ou racha!! 

É um país peculiar tal como a Argentina o tinha sido. Os heróis nacionais são Salvador Allende e  Pablo Neruda. A geografia é estranha e única no mundo. 6000 kms de altura e apenas 175 kms de comprimento! O pais tem muitos recursos, principalmente agrícolas (fruta e vinho) e minérios. A maior mina de cobre do mundo fica no norte do Chile. E quem não se lembra da recente história dos 60 mineiros resgatados através de uma cápsula mínima? A costa do pais é banhada pelo oceano pacífico. Nunca o tinha visto e é grande, azul e lindo, o oposto da piscina dos Olivais. Quando se sobe para norte temos os Andes sempre a acompanhar-nos a Este. Que lindos e altos são, sempre com os seus picos cobertos de neve.

O pais tem um total de 17 milhões de pessoas. A capital Santiago, contando com os subúrbios, tem 5 milhões. Tal como a Argentina existe uma grande concentração de pessoas na capital. Porquê? Porque é aqui que está o dinheiro, trabalho, comida e água. As outras cidades referência são Valparaiso e Concepcion.

A arte urbana está em todo o lado. Centenas de desenhos e grafittis nas paredes cheios de cores e mensagem. Valparaiso é uma das capitais mundiais do street art.

O Chile tem qualquer coisa de Portugal. A luz solar é parecida. O tipo de vento é parecido. Valparaiso faz lembrar Lisboa e a estrada que vai desde esta cidade para Vina del Mar parece a marginal que vai até Cascais. A arquitectura também é semelhante mas o mais parecido são mesmo as pessoas.

Ou são as mais amáveis do mundo ou são as maiores bestas! Se vêm que alguém necessita mesmo delas as pessoas são antipáticas. Aconteceu-nos em restaurantes, em hostels  e noutros locais. Pessoas que estão acomodadas no seu posto de trabalho e como estão a ter um mau dia prestam um péssimo serviço. Mas por outro lado também encontramos gente super prestável e simpática. A quinta onde ficamos em Bulnes foi exemplo disso. O Andres, pai do Juan Pablo Chaparro, meu amigo do RAC, recebeu-nos como reis e deu-nos boa comida, cama e roupa lavada para além de nos ter mostrado toda a quinta com muita amabilidade, obrigado por tudo.

A natureza é mais uma vez avassaladora. Aqui em São Pedro de Atacama é tudo árido e as cores no céu à noite são vermelhas e cor de laranjas. A vir do Sul passamos por centenas de kilómetros de vinhedos e pomares. As montanhas estão sempre presentes. A vida selvagem é constituída por muitos tipos de pássaros desde pelicanos a condores, passando por albatrozes. Mas aquilo que mais gostei foram os lobos marinhos. Em Valdivia quando voltávamos de um bar, demos de caras com um bando deles à beira mar. Foi engraçado interagir com eles e conhecer o Pancho, o lobo marinho renegado pelas fêmeas e que anda sempre sozinho, um pouco como o João Soares. 

Nas ruas há juventude, mercados e lixo. Com a greve geral que tem assolado o pais nestes dias, a recolha de lixo deixou de se processar e há muita porcaria nas ruas, um espectáculo dos tempos modernos e um aviso para o futuro... Nas ruas das principais cidades há muita gente e juventude. Impressionou-me uma aula de zumba que vimos no meio de Valdivia com gente de todas as idades a partir a loiça literalmente! No centro de Santiago andamos pelas ruas pedestres cheias de árvores e raios de sol e era bom estar ali... Em várias avenidas há pianos que as pessoas podem tocar se quiserem. Várias pessoas como nós reúnem-se à volta para ouvir. Tanto em Santiago como Valparaiso fomos a mercados de fruta, marisco, carne, meias, roupa, livros, antiguidades, etc.. Tudo cheio de cores e vida, excelente para dar passeios. 

Sobre a história do pais não me vou alongar muito. Mas vale a pena pesquisarem, se quiserem, a história da independência em relação a Espanha, a história de Salvador Allende, o golpe de estado de Pinochet e a história de Pablo Neruda. Tudo referências muito fortes e que vale a pena ler. 

No grupo tudo continua bem. O roubo da mala do Jiggie em Santiago podia ter fragilizado as coisas mas teve o condão de fortalecer. Ele desviou o olhar da mala por apenas 5 segundos, o suficiente para um cobarde pegar na mala e se enfiar num taxi e fugir. Mas tudo foi resolvido: já tem uma mochila nova, eu dei lhe a roupa que pude e fomos à embaixada buscar um passaporte temporário que foi logo emitido. Tudo resolvido com muita cabeça, o que pode ser difícil de manter quando se anda na estrada há dois meses!

Às vezes estamos cansados porque as condições não são as melhores. Mas é só fisicamente. 

Na nossa mente e espírito estamos motivados e muito felizes. Sabemos a sorte que temos em estar a fazer esta viagem e viver estas experiências. Todos os dias agradeço esta oportunidade e tento aproveitar o máximo. 

Amanhã passamos para a Bolívia e começamos logo com uma excursão de 3 dias no Salar do Yuni. Diz que é bonito.

Think about it!