segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O Porco - um animal fascinante... também do ponto de vista económico!

A carne de porco, ou outras partes deste animal fascinante, é uma das grandes bases da alimentação mundial. Aqui no Royal Agricultural College possuimos uma quinta com 320 porcos onde temos o privilégio de aprender tudo sobre este animal desde a sua reprodução, passando pela alimentação até ao seu bem estar em termos de alojamento.

Segundo o Eurostat, a produção de carne em termos mundiais é liderada pelo porco com 42% do total de volume produzido, seguido da vaca com 27% e depois a galinha com 25%. Em termos de tendências observam-se cada vez menos quintas a criar porcos, mas com um número de animais cada vez maior. Com o aumento do consumo a nível mundial a competitividade também aumentou e só sobrevivem os produtores que conseguem encontrar escalas interessantes e custos de produção equilibrados.

A Europa é a região do mundo que consome mais kilos de porco por habitante com cerca de 45,1 kgs/ano. Em termos comparativos cada Chinês consome em média 29,2 kgs, um Norte Americano 31,3 kgs e um Japonês 16,7. Os nossos irmãos Brasileiros consomem "apenas" 9,5 kgs de carne de porco por habitante, o que também se deve à dificuldade em criar porcos neste país devido às altas temperaturas.

Portugal está dentro da média do consumo Europeia com aproximadamente 44 kgs por pessoa/ano, mas ao contrário de muitos países Europeus que são auto-suficientes nesta àrea, produzimos 87% do que consumimos, tendo que ir buscar o resto a outros mercados. Em termos absolutos isto significa uma produção de aproximadamente 375.000 toneladas ano, ao passo que Espanha por exemplo produz 3.409.000 toneladas ano tendo um grau de auto-suficiência de 106% (mas consomem mais por habitante que em Portugal, quase o dobro).

Tal como os bovinos, trata-se de uma espécie bastante complementar com a produção de cereais. Um produtor que tenha porcos e cereais consegue retirar palha e alimentação para a gestão diária dos animais ao mesmo tempo que produz estrume para enriquecer os campos. Isto é uma das maneiras mais eficazes de gerir uma vara de porcos pois permite elevadas poupanças de custos. Basta dizer que a alimentação nos porcos é feita à base de cereais e que este custo representa entre 60% a 80% do custo total de criar um porco.

A criação de porcos tem então que seguir parâmetros e procedimentos eficientes para que se consiga fazer dinheiro do negócio, ou seja ir de encontro aos objectivos comerciais ou financeiros. Esta questão já foi mencionada neste blog mas nunca deverá ser deixada de lado: a eficiência (utilização de recursos) é fundamental na agricultura ou na pecuária tal como em qualquer negócio e deve sempre caminhar lado a lado com a sustentabilidade do animal e dos recursos utilizados tais como os solo, àgua ou alimentação.

Como se cria então uma vara de porcos de maneira eficiente para se poder ter lucro?

Para responder a esta pergunta seria necessário um livro inteiro obviamente, mas serão aqui relatados alguns aspectos fundamentais que podem também variar consoante a região, raça do porco, se é uma produção indoor ou outdoor, etc..

As fêmeas podem começar a engravidar aos 8 meses e o período gravidez dura normalmente 115 dias, que é o mesmo que dizer 3 meses, 3 semanas e 3 dias, muito fácil de decorar! Os machos podem começar a produzir filhos a partir dos 9 meses. O número médio de leitões por ninhada é 10 e a partir do momento em que um filho escolhe uma teta da mãe nunca mais muda. Costuma-se dizer que os porcos mais fortes e que crescem mais depressa são aqueles que ficam com a teta que está localizada mais perto da cabeça da mãe.

Os animais que são seleccionados para reprodução funcionam a partir daqui como uma autêntica fábrica. A partir do momento em que dão à luz, as fêmeas amamentam os filhos durante um período de 21 dias. A seguir a este período, os filhos são separados da mãe e o objectivo é que ela engravide o mais rapidamente possivel, normalmente consegue-se em 10 dias. Para isso tem que entrar no "ciclo" de novo. Este ciclo que acontece de 21 em 21 dias em média, tem a duração de 3 dias e representa o período em que a fêmea tem os óvulos prontos para reprodução. Para estimular este processo normalmente coloca-se um macho reprodutor perto de uma fêmea, mas mesmo assim separados por uma grade ou portão. Depois quando ela está pronta utilizam-se métodos naturais de reprodução ou a inseminação artificial, muito popular nos porcos.

A partir deste momento, o processo repete-se, normalmente até um máximo de 7 ninhadas, sendo que as fêmeas que conseguem atingir este número de ninhadas são as campeãs da fertilidade! Ou seja a partir dos 8 meses (240 dias), engravidam. Depois ficam grávidas 115 dias. Depois amamentam 21 dias e depois ficam grávidas de novo em 10 dias repetindo todo o processo desde o início. A razão porque já não se usa mais estas fêmeas para dar à luz a partir da 7ª ninhada é porque o número de filhos por ninhada começa a diminuir a partir da 5ª ninhada. Estas fêmeas vão depois para a produção de carne, normalmente salsichas, pois já é um animal mais velho, e como tal com menos qualidade na carne. Os macho deixam de reproduzir por volta dos 4 anos e têm o mesmo destino das fêmeas.

Fazendo uma conta básica, uma fêmea consegue então dar à luz uma média de 25 filhos por ano = (365 dias/ (115 dias de gravidez + 21 dias de amamentação + 10 dias para voltar ao ciclo e engravidar)) x 10 (número médio de filhos). É assim que se fazem as contas num negócio de porcos!!

Estes porcos são depois alimentados e vão para os matadouros com a idade de 6 meses, quando atingem um peso total à volta de 65 kilos, sendo que deste peso cerca de 70% da carcaça é carne.

Considerando o preço actual da carne de porco num matadouro de porcos no Reino Unido, 1,5 £ por kilo, o rendimento anual que uma fêmea pode dar é o seguinte:

25 leitões x 65 kilos x 70% carne x 1,5 £ = 1706 £. Se tivermos 100 fêmeas já estamos a falar de 170.000 £ o que é bastante interessante. Em termos de custos, estes variam consoante o preço dos cereais para alimentar os animais, etc.. mas aos preços de hoje em dia e com uma estrutura minima de 100 fêmeas, os produtores no Reino Unido estão a trabalhar com uma margem grossa de 10% (excluindo custos fixos).

Com a procura de carne a aumentar a nivel mundial estes preços podem tornar-se ainda mais atractivos. Para além da carne existem muitas outras maneiras de rentabilizar este animal. As partes que não são utilizadas para carne como os ossos, os orgãos, o sangue, a gordura, a pele ou o pelo já são são utilizadas no fabrico de shampoos, velas, balas, pinceis, gelados, fertilizantes, insulina, iogurtes, electricidade, comida animal, cosméticos, etc... Em alguns destes produtos são utilizados como ingredientes principais, embora noutros só participem no processo.

Em conclusão, a carne de porco está a tornar-se num negócio mais actrativo como o demonstra a produção mundial. Um negócio gerido de forma eficiente pode dar lucros ao seu produtor e não é uma industria que tenha subsidios como muitas outras. No entanto devemos ter sempre em atenção aquilo que tem sido a máxima da produção animal nos últimos anos: para se maximizar a qualidade da carne deve-se maximizar o bem estar do mesmo, e isto não é negociável!

Da próxima vez que comerem uma costoleta ou virem alguém que não toma banho... Think about it!!

Regards,

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Svalbard - A nova Arca de Noé

Depois de uma pausa motivada pelos primeiros trabalhos e pelas férias de natal o Blog dos Bosques volta a atacar!

Foi maravilhoso voltar a rever os amigos e a familia em Portugal. Apesar de me sentir um bocado deslocado da vida normal e apesar de não ter carro nem casa fixos.. a nossa pátria é sempre o local onde nos sentimos como peixe na água! A comida, os cheiros e os hábitos com que crescemos fazem parte do nosso organismo e da nossa identidade.... e estar em Portugal foi como voltar ao meu habitat natural.

Este sentimento de pertença também pode ser transportado para a agricultura: há plantas e animais que se dão bem em diversos locais mas é no sitio onde primeiro se desenvolveram e segundo Darwin, lutaram pela existência, que se vão dar sempre melhor!

Muitas espécies de animais e plantas viajaram de país para país e de continente para continente transportadas pelo homem. Muitas delas já se encontram em vias de extinção ou desapareceram dos seus locais de origem, mais uma vez devido à acção do homem.

Nos últimos 50 anos e devido a muitos factores como o crescimento de população, o aquecimento global, a destruição das florestas tropicais, o aumento do consumo de combustiveis fósseis, entre outros, extinguiram-se cerca de 300.000 espécies dos 10 milhões que se calcula existirem no planeta. Todos os anos desaparecem entre 3.000 a 30.000 espécies, um recorde sem precedentes nos últimos 65 milhões de anos.

Segundo James Howard Kunstler, no seu livro "O Fim do Petróleo", dentro de 100 anos ter-se-ão perdido entre um a dois terços de todas as aves, animais e plantas do planeta! Esta perda de bio-diversidade pode ter consequências nefastas para a espécie humana, bem piores que uma crise financeira... mas parece que por enquanto caminhamos de forma cega para um precipicio, sem que as lições aprendidas em muitas alturas da história sirvam para alguma coisa.

No entanto, parece que algumas histórias ainda nos vão ficando na cabeça e quem não se lembra da Arca da Noé? Avisado previamente por Deus de um diluvio que aniquiliaria a vida na terra, Noé reuniu numa arca um macho e uma fêmea de cada espécie para que a sobrevivência das mesmas ficasse garantida.

Em pleno Século XXI, uma experiência semelhante está a ser conduzida em Svalbard, na Noruega, onde estão a ser guardadas sementes em larga escala para prevenir uma eventual catástrofe ambiental ou climatérica.

Trata-se de um silo gigante cujo objectivo é salvaguardar as espécies de plantas que servem como alimento às populações dos mais diversos países. O silo de Svalbard preserva cerca 90% das sementes conhecidas no mundo inteiro e foram doadas pelos países produtores.

O silo foi construído no Monte Spitsein, em Svalbard e é uma estrutura inteiramente subterrânea. Trata-se de um arquipélago situado 1.000 km a norte da Noruega, e foi escolhido por ser um lugar a salvo das possíveis alterações climatéricas causadas pelo aquecimento global e/ou quaisquer outras causas.


Figura 1 - Silo de Sementes de Svalbard.

O silo tem capacidade para abrigar 2,5 biliões de sementes, ou seja aproximadamente 500 sementes de 4,5 milhões de espécies. As câmaras onde estão guardadas as sementes estão a uma temperatura de -18 °C, e se por alguma razão o sistema de refrigeração falhar, o montante de terra e pedras congeladas que naturalmente cobre o silo, o chamado permafrost, mantém as sementes entre -4 e -6 °C.

Em conclusão, nos últimos 200 anos, a expansão da população humana que passou de mil para 7 mil milhões, tem sido muitas vezes feita sem escrúpulos e à custa da natureza. A extinção de espécies animais e vegetais representa a perda de bio-diversidade inexplorada pelo homem. Estas espécies que se estão a perder, até poderiam representar uma fonte de novos recursos energéticos ou de cura para doenças humanas. A experiência de Svalbard é bem vinda pois garante a segurança das espécies vegetais em caso de catástrofe. Mais experiências semelhantes serão bem vindas!

Esperemos nunca vir a precisar deste silo... isso significa que algo correu mal.... think about it!

Best regards,