segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Ir ao Irão!


Um dos países mais misteriosos do mundo fica ali para os lados do Médio Oriente. Alguns chamam-lhe Irão. Outros mais ousados e românticos, poderão chamar-lhe Pérsia, em memória do antigo império que ali existiu há 2.500 anos, e que ainda hoje influencia os hábitos, cultura e personalidade deste povo.


Mas afinal quem são os Iranianos e o que é o Irão? Como se define um povo, cujas origens se situam numa das regiões onde nasceu a civilização e ao mesmo tempo tem servido de palco para alguns dos maiores conflitos a nível mundial? Como se define um povo que vive sob a alçada do Corão e de uma República Islâmica desde 1979, mas que também tem influências ocidentais implementadas pelo antigo Xá ou a paixão pela musica, poesia, vinho e amor herdada dos persas?


Aliás, a grande pergunta que me surge neste ano em que já visitei o país por 4 vezes, tem exatamente a ver com esta diversidade de influências… Poderá um país tão grande, tão rico economicamente e em tradições, tão jovem na sua população, ser governado por religiosos numa espécie de Teocracia Islamita e num mundo com tanta informação e avanço tecnológico?

Para responder a esta questão temos de conhecer um pouco do país e da sua população.

O Irão é o 18º maior país do mundo em área e o 17º mais populoso com cerca de 80 milhões de pessoas.  A sua capital Teerão, situada no sopé das montanhas Elbruz, é uma verdadeira mega metrópole com cerca de 14 milhões de pessoas. O trânsito e a poluição na cidade são tão intensos que por vezes as pessoas não podem sair à rua e as escolas fecham. É normal ver uma nuvem de fumo a pairar sobre a cidade ao estilo de São Paulo ou Cidade do México.

Mas à parte desse fator, estamos a falar de uma cidade altamente moderna, vibrante e cosmopolita servida por milhares de lojas, centros comerciais, mercados de rua, museus, mesquitas, jardins, complexos desportivos, segurança, transportes, escolas e estradas bem arranjadas, normalmente ladeadas por canais onde escorre a água que desagua dos picos brancos das montanhas.




Teerão é uma cidade de colinas, subidas e descidas. Para guiar aqui é preciso ser-se muito bom a fazer ponto de embraiagem. A torre de TV Milad, domina a paisagem da cidade com os seus 435 metros. É a sexta mais alta do mundo.


Os prédios habitacionais são verdadeiramente imponentes, normalmente construídos com estruturas de ferro maciço, ao invés do normal betão armado. Por toda a cidade, há gruas a anunciar a expansão da cidade. As grandes e médias organizações instalaram-se em modernos complexos e edifícios, mas devido às sanções económicas impostas pelos EUA, há muitas empresas que (ainda) não têm permissão para operar no mercado. Por exemplo, não há Macdonalds ou Burger King. Mas há Nike e Adidas. Não há Booking.com nem AirBnb. Mas há Lufthansa e Air France. Não há Visa nem Master Card. Se querem visitar o país, a única hipótese é trazer o dinheiro no bolso e trocar pelo Rial Iraniano.

O Facebook está censurado nos servidores locais. A Coca Cola supostamente é proibida, mas encontra-se por todo o lado.

O país palpita de vida e as ruas estão cheias de gente. 50% da população Iraniana tem menos de 35 anos e todos estão desejosos de progredir e vencer na vida. No entanto, o desemprego é alto e anda na casa dos 12%, obrigando bastantes pessoas a emigrar, nomeadamente para os EUA. Há inúmeras universidades, e para grande surpresa minha, vim a saber que 65% da população estudantil é do sexo feminino. Nos próximos 5 anos, o PIB vai crescer 6%. A base da economia é a produção e exportação de combustíveis fósseis. O litro de gasolina custa à volta de 0,30€.

O hábito de ir ao café pôr a conversa em dia está bastante enraizado. Os cafés de Teerão são um dos melhores locais para se medir o pulso aos costumes e observar os Iranianos.

A família é a unidade base da sociedade. Todas as gerações são muito unidas e os mais velhos são respeitados sem hesitação. Às sextas-feiras, dezenas de galerias de arte abrem as portas ao público e revelam o trabalho de jovens artistas ou outros mais consagrados.


Por todo o lado está hasteada a bandeira do país e nos estabelecimentos comerciais é obrigatório exibir fotos do líder supremo, o Ayatola Khamenei.

O papel da mulher está limitado ao que vem descrito na lei. Não podem fumar em restaurantes nem andar de mota ou bicicleta. Não podem ir a estádios de futebol. O uso do véu na cabeça é obrigatório e não é permitido expor a pele do corpo na rua. Os filmes, canais de televisão e jornais são censurados. Nenhum habitante, homem ou mulher, pode consumir álcool.    

A gastronomia é um atentado ao pecado e à satisfação do paladar. Nos restaurantes saltam à vista as romãs, tâmaras, pistácios, kebabs, sopas ricas, maçarocas de milho, azeitonas, mel, chá de menta e iogurtes misturados com pepino ou espinafres. Para os mais audazes, há um prato tradicional que pode ser servido com arroz ou salada: cabeça de ovelha. É bastante delicioso diga-se de passagem.       




A diversidade geográfica é uma realidade gritante e deixou-me verdadeiramente pasmado. Afinal o Irão não é só areia e deserto! No norte há florestas com estradas românticas e montanhas onde é necessário atravessar nuvens para chegar ao topo.

No sul, há o deserto e as ruínas de Persepolis, a capital do Império Persa fundado há 2500 anos. O túmulo do Rei Dário está escavado bem alto na parede de uma montanha. Dá arrepios só de pensar que ali se encontram os restos mortais de tão grande figura histórica.



Em termos culturais, os grandes polos de atração turísticos, são as tais ruinas de Persepolis em Shiraz, os palácios e jardins em Teerão e ainda as maravilhosas mesquitas de Esfahan, muitas delas consideradas património mundial pela UNESCO. As pinturas dos azulejos, e a arquitetura destes monumentos são de uma beleza que não têm descrição possível. Obras de arte únicas e todas feitas à mão.  




Muitas pessoas pensam que o Irão é um país Árabe onde há atentados terroristas, armas nucleares e as mulheres têm de andar tapadas de burka. Nada podia estar mais longe da verdade e reduzir o país a esta descrição representa uma ignorância total. Chamar um país Árabe ao Irão é o mesmo que chamar Espanha a Portugal. Ou confundir a ideologia e interpretação de outros que se fazem explodir em nome de Alá por esse mundo fora também é muito injusto. O Irão apenas está situado numa zona conflituosa e é um país muçulmano ponto final. Com todas as coisas boas e más que isso tem. Com certeza têm muitas coisas a melhorar e muitas lacunas no sistema nomeadamente em termos do conceito de liberdade, mas não se pode generalizar e dizer que é um país árabe cheio de terroristas. Isso é mentira e é uma generalização que não tem cabimento.

O meu fascínio pelo Irão sempre foi grande e tem vindo a ficar cada vez maior. E isso deve-se a um único fator: as pessoas. Políticas, infra-estruturas e comidas à parte, o melhor de tudo não podiam deixar de ser as pessoas. Simples, amistosas, com uma genética marcante e um carácter muito forte.

Falar da população Iraniana é o mesmo que falar de hospitalidade. Neste país é costume dispensar aos convidados as maiores gentilezas, o melhor lugar para se sentarem ou a melhor peça de carne. Tudo faz parte de um complexo sistema de cortesia pelo qual se rege o quotidiano do país. Um sistema que dá pelo nome Ta’aruf.

Falar do Irão e não falar de Ta’aruf, é o mesmo que falar de Portugal e não falar de bacalhau ou do fado. O Ta’aruf é o código que regula a vida social nos negócios, família, namoros, etc. É uma espécie de competição pela atitude mais humilde perante os outros sejam eles convidados, familiares ou parceiros de negócio. É uma atitude bastante louvável e que demonstra uma grande educação. Mas está tão enraizada que por vezes é difícil perceber as verdadeiras intenções e personalidade das pessoas. Reza a história que dois senhores encontraram-se na entrada de uma porta e que para decidirem qual dos dois passaria primeiro começaram a fazer Ta’aruf… um dizia “por favor passe, você é mais velho”, ao que o outro respondeu “Não, por favor, você primeiro pois tenho o maior respeito por si”, ao que o outro responde de novo “Não, mas você é um homem muito inteligente e educado” e por aí fora… reza a lenda que estão nisto há 620 anos…

Da minha parte, tenho sido um verdadeiro alvo de Ta’aruf e agradeço por isso. Obrigado a todos os que foram tão hospitaleiros até agora e em especial à Ghazal Vaziri, a verdadeira Princesa da Pérsia...

Visitem o Irão sem medos e de espirito aberto. O tal mistério que mencionei ao inicio existe, e os seus habitantes sabem isso… o que só faz da viagem ao Irão uma das ultimas grandes aventuras e uma experiência sem paralelo.



Think about it!

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Uma viagem pela Ásia - Parte 1 de 3.

 
Os factos relatados neste texto são inspirados em acontecimentos verídicos. Mas qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência.

Por esta altura, no ano passado, embarquei numa viagem rumo à Ásia. Foi no dia 23 de Janeiro de 2015.
Nessa madrugada, acordei na Pensão Milanesa situada nos Restauradores, baixa de Lisboa. Ali tinha vivido os últimos 5 meses da minha vida. Entre finais de Agosto de 2014 e Janeiro de 2015. Numa residência de estudantes Erasmus de várias nacionalidades. Todos na casa dos 24/25 anos.
Nesta altura eu vivia várias vidas. Todas numa só e todas em harmonia.
Durante esses 5 meses, no final de 2014, a minha rotina semanal era mais ou menos assim:
De Segunda a Quarta trabalhava numa quinta no Alentejo. Na zona de Vendas Novas. Começava Segunda-feira pelas 7 da manhã e ali ficava até Quarta-feira por volta das 17 horas.
Eram 3 dias de muito trabalho. Duro e intenso. Fosse a carregar lenha ou a tentar correr atrás de bezerros recém-nascidos para lhes colocar uma etiqueta na orelha, ao mesmo tempo que a mãe nos tentava dar cornadas.
Quase todos os dias almoçava duas bifanas no Horta e Bolota. Um restaurante na estrada de Vendas Novas. Quando as empregadas vinham receber o pedido, tapavam o nariz. Muitas vezes eu cheirava a diarreia dos bezerros, praga comum nos recém-nascidos. Andava de calças velhas e sweat shirts rotas. Também costumava andar de gorro porque o meu cabelo estava sujo e oleoso devido ao suor e ao pó da terra. O retrato perfeito de um camponês.
Foram tempos muito bons estes na quinta. Nada se compara a guiar um tractor a uma Segunda-feira de manhã. No meio de um montado alentejano para ir alimentar o gado. A ver o nascer do sol e a sentir o frio da madrugada que pela manhã se vai esvanecendo.


Dormia feliz num anexo sem televisão e internet. Com um aquecedor e uma cómoda ao lado da cama. Ia para a cama por volta das 22 horas. A austeridade no seu esplendor. 
Quarta-feira à noite ia para Lisboa e começava outra vida.
Ficava a dormir na tal Pensão Milanesa, a residência de estudantes situada em plena Praça da Alegria, junto aos Restauradores.
Foi uma experiência muito forte e enriquecedora. Fiz grandes amizades com pessoas livres, divertidas e interessantes. Principalmente franceses. Pessoas com um espirito generoso, simples e uma excelente base de conhecimentos em várias áreas. Quem diz que os mais novos não sabem nada?
E fartávamo-nos de fazer coisas e passear!  
Por vezes, saiamos de Lisboa durante três ou quatro dias fora e viajávamos por Portugal inteiro de norte a sul. Caminhamos sozinhos em praias desertas na zona de Vila Nova de Mil Fontes e subimos à Torre na Serra da Estrela. Fomos ao Porto e vimos as ondas gigantes na Nazaré. Muitas vezes, eu era o guia e lá ia mostrando o meu país com orgulho. Mas também fui a sítios que nunca tinha ido.
No solstício inverno, dia 21 de Dezembro de 2014, fomos ao cais palafítico na Comporta e vi o por do sol mais bonito da minha vida.
 
 
Às Quintas-feiras, costumávamos íamos para um Bar na Mouraria e dançávamos com alegria num ambiente a fazer lembrar um bar mexicano misturado com santos populares. Tínhamos sempre o nosso cantinho para onde atirávamos os casacos e as malas. E o grupo rapidamente se alargava com pessoas que íamos conhecendo ou os meus amigos portugueses que se iam juntando.
Na residência, era como morar num manicómio intercultural. Várias línguas a serem faladas, histórias, gritos e gargalhadas. Não havia casas de banho privadas. Apenas 3 no corredor. Partilhadas por 12 selvagens. O consumo diário de papel higiénico andava nos 400 rolos. Na banheira, o pé-de-atleta era tratado por tu.
A cozinha era o espaço comum e lá nos encontrávamos e convivíamos.
No lava-loiça, os pratos acumulavam-se por vezes a alturas mais altas que o Evereste.
A toalha da mesa, cheia de marcas de chávenas e queimaduras de cigarro, estava habitualmente coberta dos mais variados objetos. Copos, cinzeiros, headphones, telemóveis, mapas, livros, comida do dia anterior ou algo tão bizarro como um duende de porcelana. Um moleskine aberto mostrava um texto ou desenho de alguém.
Uma vez o frigorífico começou a cheirar mal. Um saco de carne picada putrificava há vários dias nas prateleiras. O cheiro era tão forte que ainda hoje me pergunto como não atraímos abutres ou o pessoal de alguma agência funerária.
E apesar de todos estes ataques directos à ASAE vivíamos bem. A felicidade fazia o ambiente e não o contrário.  
Nestes dias em Lisboa, também frequentava as aulas de piano e pintura durante várias horas. Desde Janeiro de 2014 que tinha começado a praticar e andei o ano todo a cultivar a aprendizagem destas artes.
A excitação apoderava-se de mim nesses momentos. Estava realmente a aprender algo novo. Algo que me permitia expressar as emoções de forma diferente e passar um tempo de verdadeira qualidade e satisfação.    
Estava tão interessado no processo artístico, que no inicio de 2014, iniciei o Blog Artes e Tartes. Um espaço dedicado a compreender o que é a arte e como se forma um artista. De onde vem a inspiração.  
Depois, aos sábados ia para a casa do meu pai ao pé de troia e lá ficava a organizar as minhas papeladas, a pintar, a praticar piano, correr, andar de bicicleta e descansar um pouco também.
A Segunda-feira estava a chegar e tudo ia recomeçar outra vez.
Antes destes 5 meses, e durante 2014, tinha andado muito focado nas tais artes e também no trabalho agrícola em Portugal. Fui a vários congressos, formei uma sociedade agrícola e visitei muitas quintas em Portugal. Estava determinado a conhecer o sector e a tentar investir nele. Essa vontade ainda se mantém.
Em 2013, tinha terminado a minha Licenciatura em Agricultura em Inglaterra. No Royal Agricultural College em Cirencester. Foram dois anos a aprender tudo do zero e onde mais uma vez fiz vários amigos estrangeiros. Também passei muito tempo sozinho o que foi bom porque estudei, li e cultivei-me bastante. Acabei o curso com boas notas e acabei por me envolver em alguns projetos de investigação.
Na Universidade de Agricultura também fazia muito desporto. Fui o treinador e capitão da equipa de futebol de 11, mas também tinha que lavar os equipamentos. Aos domingos de manhã, ia para uma lavandaria no centro da vila, punha moedas em 3 máquinas e ficava ali sentado a estudar, enquanto os equipamentos todos suados e enlameados rodavam violentamente no tambor. Depois de lavar, colocava os equipamentos encharcados para secar. 15 calções, 15 t-shirts e 15 pares de meias. As máquinas de secar abanavam tanto que pareciam estar vivas e querer sair a correr rua fora. 


Conseguimos não acabar em último e ainda marquei uns golos. Mas foi nessa altura que percebi que o fulgor da juventude já não era o mesmo. Aos 30 anos, é simplesmente impossível correr atrás de miúdos de 18!
Como não tinha muito dinheiro, só almoçava fora da cantina duas vezes por semana. Uma vez ia comer peixe ao restaurante de sushi no centro de Cirencester e na outra um bife com batatas fritas a um restaurante chamado Made by Bob. Eram momentos de felicidade. A qualidade da cantina da universidade era precária e dei por mim a comprar regularmente chocolates, batatas fritas e bolachas para ter na gaveta da mesa de cabeceira. Passei momentos decadentes a comer chocolates e a fazer streaming dos jogos do Benfica. Enquanto o inverno Inglês fazia das suas lá fora.
No verão de 2012, a meio do curso, decidi que precisava de reforçar o meu conhecimento do trabalho no terreno e fui trabalhar para uma quinta na Austrália. Em Stanhope, Victoria State. Uma terra no meio do nada a 6 horas de autocarro de Melbourne. Uma coisa era fazer exames na Universidade e trabalhos de grupo. Outra era ir para o terreno.
Foi a minha primeira experiência numa quinta e correu tudo muito bem. Mais uma vez em regime de muito trabalho e pouco conforto. Fiz muitos amigos e aprendi coisas novas. De madrugada, pelas 5 da manhã, e ao final da tarde, ia buscar as vacas para a sala da ordenha. Ordenhar é uma das rotinas mais duras que vi na minha vida. Faço uma vénia a quem está no sector e luta todos os dias para ganhar uma margem ridícula…
No resto do dia fazia as várias rotinas de uma quinta: fazer vedações, cortar lenha, semear campos e matar galinhas.


Nesses dois meses também aproveitei para visitar Sidney e outros países da região como a Malásia e a Indonésia. Um bom amigo local, que tinha conhecido nesse ano em Inglaterra, recebeu-me na sua casa em Jacarta. Fui recebido como um rei. E enquanto a sua família estava no ramadão eu era presenteado com verdadeiros banquetes. Vi o jogo Portugal-Espanha, da meia-final do Euro 2012, numa casa perdida algures em Bali. Assisti a um casamento vestido a rigor.
Na altura que acabei o tal curso de Agricultura em 2013, decidi ir conhecer a América do Sul.
Primeiro para trabalhar durante um mês. Numa quinta na Argentina. E depois para conhecer o continente de ponta a ponta.
A Mafalta era uma quinta situada a algumas horas norte de Buenos Aires. E apesar de ser um local dominado por um dono tirano, foi um local onde voltei a ter grandes experiências. Íamos ao campo apanhar cavalos selvagens, matávamos porcos para comer, fazíamos pão todos os dias e foi também lá que comecei a desenvolver o gosto pelas artes. As paredes dos quartos, da cozinha e da casa-de-banho da quinta estavam repletas de desenhos, pinturas e frases inspiradoras.
Estávamos em Setembro de 2013. E depois de 25 dias na tal quinta da Malfata, viajei com o meu irmão e mais um amigo por todo o continente Sul-Americano. Vimos a Garganta del Diablo nas cataratas do Iguaçu. Navegamos junto ao farol do fim do mundo no Canal de Beagle em Ushuaia. Visitamos as casas do poeta Neruda no Chile. Descemos a estrada da morte, de bicicleta, em La Paz na Bolívia. Vimos o nascer do sol no Salar do Uyuni. Subimos até à cidade perdida de Machu Pichu no Perú.


Foi uma viagem muito marcante. Tive momentos que despertaram em mim uma maior consciência social e por tudo o que nos rodeia, o gosto pelas artes, um maior auto-conhecimento e respeito pela natureza. Foi uma viagem de descoberta. A melhor da minha vida.
Entre 2004 e 2011, durante os anos de trabalho em multinacionais, aproveitava as férias e viajei para outros locais do mundo como o Sri Lanka, o Omã, Polónia ou Bulgária.
Em 2006 fui de carro até Marraquexe em Marrocos.
Ainda em 2006 ganhei um prémio de vendas na empresa em que trabalhava e fui ver um jogo do Mundial na Alemanha. O Portugal-Inglaterra dos quartos do final. Partimos numa sexta de manhã e voltamos domingo. 50 horas seguidas acordado e uma tarde gloriosa de futebol em que o Ronaldo arrancou a expulsão do Wayne Rooney, e passou a ser odiado em todos os estádios Ingleses.
Em 2004 fiz um interrail sozinho pela Europa. Uma epopeia de comboio que me levou a lugares míticos como Amesterdão, Berlim ou Praga. Conheci pessoas estranhíssimas em lugares estranhíssimos. Quando se viaja sozinho, todos os malucos vêm ter connosco.


 

Em 2003, vivi 6 meses na Dinamarca ao abrigo do programa Erasmus. Foi a primeira que vez que morei sozinho. 6 meses surreais com bastante festa, mas onde também me deu para conhecer a mentalidade e cultura Escandinavas. Algo com o qual ainda hoje me identifico e faz parte de mim. A igualdade social do welfare state e o civismo das pessoas marca qualquer um. Depois têm a falta de sol mas isso é outra história. Nós temos a mais. E isso também pode fazer mal.
O meu pai sempre cultivou o gosto de viajar em família e mais ou menos de 3 em 3 anos, entre 2000 e 2009, levou-nos a fazer 3 viagens. A primeira foi ao Brasil, depois à Croácia e a última um raid pelo Báltico: Suécia, Finlândia, Estónia e Rússia. Visitei o grande Hermitage em São Petesburgo e vi o sol durante a noite em Estocolmo.
No verão de 2002 fui trabalhar para uma empresa em Madrid. 2 meses sozinho enquanto o verão se festejava em Portugal. Na altura o currículo é que interessava. Visitei os grandes museus de Madrid e o Convento do Escorial a norte da cidade. Sem palavras. Tirei uma foto com a Taça da Liga dos Campeões que o Real Madrid acabara de ganhar com um grande golo de Zidane.
Por outras ocasiões, fosse em trabalho ou com família e amigos visitei, Paris, Barcelona, Genebra, Roma, Londres e Bruxelas. Ando nestas cidades completamente à vontade e conheço os principais pontos de referência como restaurantes, estações de comboio, monumentos. Já fui aos Açores e Madeira.


Mas voltando ao início...
Por esta altura, no ano passado, embarquei numa viagem rumo à Ásia. Foi no dia 23 de Janeiro de 2015.
Mas esse não foi o primeiro dia de viagem. Essa já tinha começado há muito, muito tempo.
Às vezes acordo e não sei onde estou.  

(to be continued)