quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Bifes de Vaca - com batatas fritas de preferência!

A carne de vaca faz parte da dieta regular do mundo ocidental desde que esta foi domesticada no período neólítico, há cerca de 10.000 anos atrás. O que faz  uma carne ser boa está directamente relacionado com a espécie da vaca que estamos a falar, a alimentação que esta teve, a quantidade de gordura, o tratamento que teve no matadouro, as condições de refrigeração a que a carcaça do animal esteve sujeita, entre muitas outras.

O estudo de todas as condições que influenciam a qualidade da carne tem sido aperfeiçoado numa óptica de produção, geração de valor acrescentado e rentabilização do lucro. Tenho sempre um bocado de receio de misturar as expressões "maximização do lucro" e "qualidade" quando estamos a falar de animais e plantas.

No entanto, nos últimos anos, o caminho tem sido no sentido de proporcionar aos animais o máximo bem estar possivel desde o momento em que este é apenas um feto até ao momento em que está no prato do consumidor!

Nos mercados mais evoluidos, ou mais ocidentalizados digamos, a legislação condena más condições de manuseamento ou higiene dos animais, falta de refrigeração nos camiões ou supermercados, etc... tudo numa óptica de proteger os animais e os consumidores. Basta referir para este efeito a nossa tão badalada ASAE, que quer queiramos quer não, já detectou situações que prejudicavam bastante os consumidores. Estas garantias de qualidade na produção são um dos principios essenciais para se poder exportar produtos também. Nenhum país que queira entrar com os seus produtos nos EUA, França, Espanha, Reino Unido, etc... pode ambicionar fazê-lo sem boas práticas de alojamento, higiene, manutenção, abate e transporte.

Para além disso, hoje em dia todos os produtos são registados e seguidos desde o produtor até ao supermercado mesmo que este fique do outro lado do mundo, por isso o compromisso com a qualidade é fundamental para não arruinar o negócio!

Mas o que é um bife com qualidade?

Escusado será dizer que a qualidade varia consoante o gosto de cada um. Aqui entramos mais uma vez no chavão: o consumidor é rei!! Os produtores e todos os players de mercado sejam eles restaurantes, talhos ou supermercados têm de ouvir os gostos do consumidor, segmentar a oferta de mercado e disponibilizar um conjunto de produtos e sortido a determinado preço que permitam satisfazer as necessidades do consumidor (frase aprendida na Universidade Católica Portuguesa).

Julgo que há um factor comum na definição de qualidade para todos nós: a garantia de satisfação equivalente quando repetimos uma experiência. Ou seja sabermos que aquela carne que estamos a adquirir vai corresponder a determinada experiência gastronómica e equivale a um determinado conjunto de nutrientes e bem estar para o nosso corpo.

Porque vamos à Portugália? Ou aos Bifes do Império ou Café de São Bento? Porque sabemos que existe uma qualidade associada aquele produto e estamos dispostos a pagar um preço premium para a ter. E se não estiver bom podemos sempre mandar para trás!!

Mas e no supermercado? Como detectamos um bife de qualidade?

A verdade é que quando compramos uma caixa cons uns bifes crus lá dentro, não fazemos a minima ideia ao que aquilo vai saber!!

Olhamos em primeiro lugar para o aspecto da carne. Uma carne com uma boa cor é essencial para abrir o apetite e conduzir ao acto de compra. A cor depende da idade do animal, quanto mais novo mais clara será a carne. Os animais que são destinados ao abate têm normalmente à volta de 20 meses. É nesta altura que atingem o seu auge em termos de constituição fisica e saúde. É como um ser humano entre os 16 e 18 anos. Nesta altura as proporções entre ossos, musculos e gordura é a ideal, ou seja o animal atinge o plateaux da sua existência e as rentabilidades são as mais altas possíveis.

Outro dos factores muito importantes que influencia a cor da carne é o seu nível de PH. Quando uma vaca está viva ou mesmo um ser humano o PH dos seus músculos é neutro, ou seja apresenta um valor de 7. Nos músculos existe uma molécula chamada Glicogénio. Trata-se de uma das principais fontes de energia dos nossos músculos, ajudando à coesão entre células e também no fortalecimento das articulações e ossos. Esta molécula é constituida por átomos de Carbono, Hidrogénio e Oxigénio. Ora quando fazemos um grande esforço ao qual não estamos habituados retiramos o Oxigénio ao Glicogénio nos músculos e este transforma-se em ácido lácteo. Todos já sentimos a sensação de musculos doridos depois de um esforço a que não estamos habituados.

Já foi aqui referido que o bem estar dos animais é muito importante para a qualidade da sua carne e esta é uma das principais razões: na altura de abater o animal, se for causado um stress excessivo no seu transporte, ou nas horas antes do abate pelas condições de alojamento ou actos violentos na pesagem  ou ainda outros factores a que ele não esteja habituado, todo o o trabalho que se teve até aquele momento em termos de "construir" um animal de qualidade vai ser desperdiçado!

Isto porque um animal em stress vai ter de usar as suas reservas de Glicogénio para combater o esforço a que foi sujeito!

Para uma carne ter qualidade é necessário que quando o animal morra, ou seja quando o seu coração e cérebro parem, ainda hajam suficientes reservas de Glicogénio nos seus músculos para que desta forma e através da sua respiração anaeróbica possam baixar o PH para 5,5. Ou seja a carne boa para consumo humano é ácida e se o animal não tiver Gliocogénio nos músculos quando é abatido este processo não de acidez não se concretiza!! A acidez torna a carne mais tenra e evita a formação de bactérias que gostam do PH 7.

Uma carne mais avermelhada e já a tender para o castanho, pode significar entre outros motivos, (como já foi mencionado acima ser de um animal mais velho), que o animal não tenha sido bem tratado e não tenha um bom nível de acidez, ou seja propicio à instalação de bactérias! Atenção à aquisição destas carnes!

O frio e refrigeração são fundamentais na gestão da qualidade da carne precisamente porque ajudam o PH a descer e a manter-se nos níveis ácidos necessários para consumo. Se deixarmos a carne exposta ao ar ela vai ficar castanha e o seu PH sobe ficando apetecivel para os mosquitos e bactérias. O modo como cozinhamos a carne na nossa cozinha também pode destruir a qualidade de uma carne. A capacidade de reter àgua numa carne é muito importante e se esta se libertar pode entrar em Hidrólise e destruir as moléculas que a constituem assim como as suas proteinas. A refrigeração é importante no supermercado mas também nas nossas casas. Quando pomos carne no frigorifico devemos colocá-la o mais abaixo possivel mas longe da fruta ou legumes.

Uma carne com um bom nível de gordura também é importante para a definição da compra. A gordura traz o sabor à carne, dai que nos EUA por exemplo, as carcaças de bovino mais valiosas são aquelas que têm mais gordura. Tudo depende dos gostos mais uma vez. A carne de vaca pode ser feita através de vitelas, vitelos castrados ou não castrados. Tal como nos seres humanos, as fêmeas também têm mais tendência para acumular gordura enquanto os machos tendem a acumular musculo, consoante o exercicio e a alimentação claro. Mas a verdade é que cada consumidor procura sempre um equilibrio entre carne, gordura e sabor mas poderá optar por comer vitelos ou vitelas para procurar esse tal equilibrio no que come.

Toda esta informação mencionada até agora deverá estar contida nas etiquetas das embalagens de carne ou nas placas do talho. Outra informação muito procurada hoje em dia é a origem, que também deverá estar discrminada na caixa. No entanto,e à semelhança de muitos outros produtos, se o processamento ou a embalagem for efectuada em Portugal por exemplo, isso já garante ao produto um código de barras nacional 560, embora a carne possa vir da América do Sul. É importante vir discriminado em que país viveu o animal!

Hoje em dia estudam-se novas técnicas para melhorar a qualidade da carne. Há vacas no Japão que são massajadas (Kobe), há produtores que em vez de pendurarem a carcaça pela pata (onde está o calcanhar de aquiles), penduram pelo rabo afirmando que deste modo os musculos das patas e coxas não ficam tão "esticados" e têm uma qualidade superior. Também já existem scanners que determinam e verificam ao detalhe as constituições das carcaças em termos de gordura, ossos e músculos permitindo aos distribuidores comprar carne com mais confiança. Outra das grandes tendências é a carne orgânica, que basicamente se caracteriza pelos animais comerem apenas rações orgânicas (que não foram sujeitas a fertlizantes e pesticidas) e não poderem levar antibióticos até x dias antes de serem abatidos. Este tipo de carne até poderá à partida ter um um aspecto mais magro, mas é mais saudável do ponto de vista dos nutrientes, sendo por isso mais cara também.

Em conclusão a carne de vaca quer-se com qualidade mas devemos estar atentos à sua cor, textura, gordura, se é tenrinha e olhar muito bem para as etiquetas das embalagens. Como já foi dito neste blog as características da qualidade da carne encontram-se localizadas nos genes dos animais dentro dos cromossomas. Se dermos aos animais um ambiente sem stress, com bons cuidados e nutrição vamos estar a maximizar a qualidade, (não interferindo com o funcionamento desses genes) e também o lucro. É uma situação win-win pois representa um compromisso sério com a qualidade, uma permissa fundamental em qualquer negócio!

Peço desculpa aos vegetarianos por tanta informação sobre bifes!

A próxima vez que forem ao Pingo Doce comprar carne... Think about it!

Best Regards,

2 comentários:

  1. mais um strike, Pedro! Keep them coming, faço sempre uma pausa para ler os teus textos. E fico sempre com vontade de ler o próximo...

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  2. Muito bom post PQ.

    Com isto tudo abriste-me o apetite, vou ali à Portugália como um bife do lombo e já venho!

    Venha de lá o próximo post!

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